Review – X-Men: Dias de um Futuro Esquecido

Antes de qualquer coisa, preciso fazer um mea culpa. No começo do ano, fiz uma pequena lista com os pontos que me faziam acreditar que X-Men: Dias de um Futuro Esquecido poderia ser uma bucha tão grande quanto o famigerado X-Men 3. Tudo indicava para isso, por mais triste que fosse.

E eu não poderia estar mais errado quanto a tudo isso.

Agora que o filme está chegando aos cinemas, é possível ver o quanto a divulgação e as impressões originadas dela não fazem jus ao que vemos na telona. É claro que muitos dos pontos que eu citei naquele texto se provaram verdade, mas não a ponto de fazê-lo esquecer o quão divertido é tudo aquilo.

Na verdade, por mais que muitos  torçam o nariz ao nome do diretor, o retorno de Bryan Singer à série uma das melhores coisas que aconteceu aos mutunas desde X-Men 2 — não que isso seja muito difícil, na verdade.

Botando ordem no barraco

E o maior mérito deste filme é ele ser sincero em assumir que a cronologia da série está uma zona. Se a coisa já era bagunçada apenas com a trilogia original, os spin-offs do Wolverine e a chegada de First Class serviram para deixar o que era ruim ainda pior. Era por isso que um reboot era mais do que necessário.

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Só que, em vez de simplesmente resetar a coisa toda e ignorar o que tinha sido feito até então — como tentaram com o filme anterior —, o novo X-Men decidiu usar esse caos que é sua linha temporal em seu favor para usá-lo como pretexto para esse recomeço. E essa é uma sacada genial.

Dias de um Futuro Esquecido é o gatilho para o reboot que a Fox precisava. Nos quadrinhos, quando uma editora vai reiniciar seu universo e mudar o status de seus personagens, isso nunca é feito de maneira gratuita, mas como resultado de algum evento que resulta nessas mudanças. E o novo filme é exatamente essa justificativa para resetar a franquia e apagar todo o lixo do passado.

Em outras palavras, o novo filme é bom porque ele simplesmente apaga X-Men 3 da cronologia. Alguém dê um Oscar ao Bryan Singer, por favor.

Great Scott!

Como Marty McFly bem nos ensinou, você não pode mexer com o passado sem esperar grandes transformações no futuro. E X-Men: Dias de um Futuro Esquecido soube aproveitar essa lição muito bem na hora de nos apresentar essa nova história.

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A trama começa mostrando um futuro totalmente zoado em que os mutantes são caçados por Sentinelas e os poucos sobreviventes vivem escondidos nos mais diferentes buracos do planeta. É nesse contexto chorumento que encontramos Kitty Pride, Xavier, Magneto, Wolverine e mais um monte de personagem bucha.

E o que você faz quando alguém de seu grupo simplesmente tira da cartola um poder de enviar pessoas para o passado? Assim, eles enviam a consciência do Carcaju para a década de 70 na esperança que ele possa reunir os X-Men daquela época. A ideia é que, juntos, eles possam impedir a Mística de matar Tyrion Lannister um importante cientista, evitando o início à perseguição a mutantes que desencadearia naquela realidade desgraçada.

O conceito parece confuso à primeira vista, mas funciona muito bem. O enredo se desenvolve de maneira bastante clara e podemos conferir as motivações e os dilemas de cada um dos personagens, o que faz com que as coisas fiquem bem interessantes. Chega a um ponto da trama que você simplesmente não sabe mais para quem torcer.

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E o principal mérito disso é o foco dado ao elenco de First Class. Contrariando todas as expectativas, Wolverine não é o protagonista de Dias de um Futuro Esquecido. Ele é apenas o gancho que une as duas séries, pois a história se concentra novamente nos jovens Xavier e Magneto.

Isso é ótimo por uma série de razões. Além de ninguém mais aguentar o Hugh Jackman como herói principal, a dinâmica de James McAvoy e Michael Fassbender é muito boa. A relação dos dois personagens é bem mais conflituosa do que antes e traduz bem aquilo que a gente viu por anos nos quadrinhos. E, mais do que isso, ainda vemos a influência de cada um deles sobre a Mística, trazendo uma profundidade curiosa a esse triângulo exclusivo do cinema.

Ok, mas a gente quer ver poderes

Apesar de o enredo estar quase que redondinho, o que a gente realmente quer ver ao ir assistir a um filme dos X-Men é um monte de mutante abusando de seus poderes. E isso Dias de um Futuro Esquecido faz muito bem.

O destaque nesse aspecto fica para as cenas do futuro — uma vez que esse núcleo existe apenas para isso. Bryan Singer sabe utilizar muito bem as várias habilidades dos mutantes e, acima de tudo, como colocá-los atuando como uma equipe de verdade. E podemos ver isso várias vezes nessas cenas.

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Por mais que a realidade apocalíptica seja repleta de buchas — quem diabos se lembra do Mancha Solar? —, o diretor conseguiu fazer com os momentos desse bando de inúteis em tela valessem a pena. Ver a cocotinha da Blink abusando de seus poderes em conjunto com o Colossus ou do Apache para derrubar os Sentinelas é de fazer você pular da cadeira.

Os robôs também têm seus momentos de glória, principalmente por conta de sua capacidade de adaptação. Isso os torna tão apelões que eles são praticamente invencíveis, decapitando e dividindo alguns heróis ao meio.

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Já no passado, embora a cena do Magneto erguendo um estádio só porque ele pode seja bem legal, a verdadeira estrela da pancadaria é o polêmico Mercúrio — que aqui se chama apenas Peter Maximoff. Apesar de sua caracterização de bosta, ele é um dos melhores personagens de todo o filme.

E não apenas por introduzir um pouco de descontração para o tenso início do filme, mas pela ótima forma como sua supervelocidade é retratada. A solução encontrada para mostrar o quão rápido ele é foi muito bem sacada, sendo diferente daquilo que a gente já viu no cinema ou na TV — e a Marvel vai ter de se virar para fazer melhor em Vingadores 2. É algo bem simples, mas que funciona tão bem que você fica querendo ver mais daquilo. Só é uma pena que ele apareça tão pouco em tela.

Mutantes a granel

Apesar de eu estar errado quanto a Dias de um Futuro Esquecido ser uma bomba, uma coisa eu acertei: a grande quantidade personagens inúteis colocados em cena apenas para fazer volume. Seguindo a maldita mania da Fox, o novo filme traz uma cacetada de mutantes ao elenco, sendo que apenas um terço deles é realmente relevante. O resto ta lá pra fazer número e levar porrada.

Só os buchas
Só os buchas

O núcleo do futuro é quase que inteiramente descartável. Com exceção de Xavier, Magneto, Wolverine e Kitty Pride, todos os demais estão ali apenas pra constar e fazer valer algumas cenas de ação. A quantidade de buchas é tão grande que eles conseguem morrer mais de uma vez no filme.

E o pior é que essa inutilidade não se resume apenas aos personagens desconhecidos, mas também aos velhos rostos. Homem de Gelo e Tempestade são os exemplos mais claros, visto que eles não fazem absolutamente nada, servindo apenas como figurantes de luxo. É tão ridículo que a primeira — e talvez a única — fala da Hale Barry acontece somente após a primeira hora, mesmo ela sendo uma das primeiras mutantes a aparecer.

É claro que eles estão ali para dar coerência à história, mostrando que há sobreviventes e que há um vínculo com os longas anteriores. Mas havia necessidade de estender tanto essas cenas? Não bastava só mostrá-los no começo para contextualizar a situação ao espectador e usar esse tempo extra com coisas que realmente valessem a pena, como os novos poderes de Kitty Pride? Por que não explorar melhor o Mercúrio e fazê-lo por mais tempo?

Por ter tanta gente disputando preciosos segundos em tela que Dias de um Futuro Esquecido sofre com a queda de ritmo. As cenas no futuro, que deveriam ser breves, acabam se estendendo demais exatamente por querer mostrar de quem essa corja toda está apanhando.

Aliás, eles podiam juntar o salário que foi pago para esse bando de gente para readquirir a trilha sonora clássica do desenho dos anos 90.

O valor de um reboot

O principal feito de X-Men: Dias de um Futuro Esquecido não é apenas unir uma boa história a ótimas cenas de ação. Ele é um filme que se destaca por ser uma saída inteligente a todas as cagadas que o estúdio fez nos últimos 15 anos. Ele é sincero ao assumir que a franquia estava repleta de problemas — leia como “X-Men 3” — e traz uma ótima forma de corrigir isso.

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Os fãs mais conservadores torcem o nariz à série por conta das diversas mudanças propostas, chegando ao ponto de não considerarem os filmes como adaptações de quadrinhos. No entanto, o novo longa é o que mais se aproxima de uma das estratégias mais populares das HQs: as megassagas.

Todo reboot dos gibis é precedido por algum evento que reúne vários heróis e que traz mudanças significativas à história. E Dias de um Futuro Esquecido faz exatamente isso, introduzindo um belo roteiro para justificar as alterações propostas.

É claro que isso não vai acabar com todos os problemas de roteiro e ele mesmo insere novos furos, embora nada comprometedor. Porém, o filme consegue não apenas pôr ordem no barraco como reiniciar e renovar a série, dando o gancho perfeito para que a nova equipe assuma o papel principal. Já sabemos que vem uma sequência por aí e esperamos que seja protagonizada pelos jovens Xavier e Magneto e não mais por Hugh Jackman e a velha patota.

Por fim, o novo X-Men fala sobre voltarmos a ter esperança. E não apenas por algo piegas como a reconstrução dos ideais, mas de algo muito mais simples e próximo. Dias de um Futuro Esquecido é sobre voltarmos a nos empolgar com universo dos mutantes — algo que não conhecíamos há alguns bons anos.