Ficção científica é um gênero capaz apresentar várias das mazelas atuais da sociedade com uma fantasia colorida ou uma ambientação futurista, fazendo com que uma mensagem forte seja passada para o público sem parecer que está pregando algo. Mickey 17, novo filme do diretor Bong Joon-ho, ganhador do Oscar de Melhor Diretor por Parasita, poderia ser visto apenas como um longa com o Robert Pattinson dobrado, fazendo uma voz esquisita e se passando no espaço. Só que ele traz por baixo uma crítica social ao idolatrismo, empresas, a falta de consideração com classes mais vulneráveis e a aparentemente imparável marcha da humanidade rumo à sua extinção.
Mickey 17 mostra um futuro em que a Terra está cada vez mais inabitável. Mickey e um amigo tentam viver a sua vida, mas após se envolverem com agiotas que vão querer o dinheiro de volta ou as suas cabeças, resolvem fugir do planeta. Literalmente.

Um político fracassado, interpretado por um Mark Ruffalo com alguma coisa na boca que deixou ele ESQUISITO, lidera uma viagem espacial para outro planeta, buscando colonizar e “salvar a humanidade”. É nessas que, sem saber direito o que estava aceitando, Mickey aceita ser o Dispensável dessa viagem.
Sua tarefa é fazer testes e realizar tarefas que seriam letais, desde entender o comportamento do corpo humano no espaço, até ser exposto à vírus que poderiam acabar com todos os tripulantes da nave, servindo como cobaia para vacinas. As coisas ficam ainda mais caóticas quando isso se torna possível através de clonagem.
Sempre que Mickey vai para uma missão, tem suas memórias e personalidade upadas em um tijolo. Quando ele morre, seu corpo é recriado em uma espécie de impressora 3D e sua mente é baixada. É por isso o nome Mickey 17, por ele ser o décimo sétimo clone em uma viagem de 4 anos.
Quando ele é deixado pra morrer em um planeta gelado, mas acaba sobrevivendo, descobre que sua possível morte iniciou o processo de um novo clone ser criado, quebrando uma lei de que não poderiam existir múltiplos. E daí você segue pra história toda do filme.
Resumão ou preparação pro que importa?
Parece que eu contei o filme inteiro, mas tudo isso está presente na primeira meia hora dele. Mickey 17 é um filme que às vezes parece um pouco longo e confesso que a primeira hora dele pode ter sido picotada de alguma forma, com uma narração constante do Robert Pattinson pra amarrar uma cena na outra.

Porém, é possível notar que o diretor Bong Joon-ho quer contar algo além de uma história de clones no espaço, apresentando tudo de uma forma que se você olhar com mais cuidado, consegue captar críticas sociais ao capitalismo, à forma como pessoas comuns se agarram a possíveis charlatões que se passam por gênios, e a total falta de apreço pela vida humana de pessoa que são consideradas “descartáveis”.
O diretor conseguiu fazer isso com maestria em Parasita e tenta novamente trazer um pouco dessas críticas para um potencial blockbuster como Mickey 17, mas parece estar mais comedido e tentando divertir mais do que esfregar na cara os problemas da sociedade. Isso faz com que algumas cenas que poderiam ser mais impactantes sejam apenas ok, algo que para um diretor do calibre de Bong Joon-ho parece bem pouco.
Robert Pattinson é um esquisito incrível
Porém, como esperado, Mickey 17 consegue ser um filme muito interessante graças à atuação de Robert Pattinson. Apesar de o elenco ter grandes nomes, como Mark Ruffalo e Toni Collette, todos parecem ainda ser um pouco caricatos demais pra mostrar um ponto. Pattinson já abraça sem medo de ser feliz o papel de um sujeito completamente perdido na vida, disposto a morrer inúmeras vezes por algo que não acredita.
Há anos, Robert Pattinson não pode mais ser chamado de “o cara de Crepúsculo” ou o “Cedrico de Harry Potter”, já que vem realizando filmes realmente interessantes, mostrando todo o seu talento em produções independentes ou em blockbusters como Tenet e Batman.

Em Mickey 17, ele tem um magnetismo incrível, mesmo com um personagem que apesar de sua condição, é covarde e pouco interessante. As coisas mudam quando Mickey 18 entra em cena, com uma personalidade completamente diferente e que coloca Pattinson atuando ao lado de Pattinson, ressaltando o talento dele como ator.
Você compra logo de cara a ideia de que são duas pessoas diferentes, apesar de serem clones idênticos com as mesmas lembranças um do outro. Esse relacionamento entre os dois, além de uma cena realmente engraçada deles com Nasha, a namorada de Mickey, traz ânimo pro filme, que parece engrenar de verdade quando 18 aparece pela primeira vez.
Quase lá!
Mickey 17 é um filme que apesar de uma primeira metade que dá muita a impressão que teve alguns cortes um pouco caóticos, se resolve bem na segunda metade pro final, entregando um filme divertido, ainda que bastante esquisito. Às vezes, passa a impressão que o diretor queria algo mais sério, mas que aos poucos foi cedendo para entregar uma ficção que agradasse um número maior de pessoas.
Mickey 17 está longe de ser um filme ruim, pelo contrário, é bastante competente, mas fica um gostinho de “poderia ser mais” quando os créditos surgem na tela.