Torcedores, calma: Forza Motorsport está bonito, mas e o resto?

O evento da não-E3-que-se-pareceu-muito-com-uma-E3 da Xbox/Bethesda, que rolou no último dia 13 de junho, serviu para mostrar vários jogos maneiros. Um dos mais aguardados pelos fãs mais ferrenhos da marca e do gênero de corrida, no entanto, era Forza Motorsport

Depois de passar anos alternando seus lançamentos bi-anuais com o irmão mais novo de franquia, o Horizon, em 2018 a regra foi quebrada e a série com pegada mais arcade teve dois lançamentos consecutivos – enquanto nada foi falado do simcade da Turn 10 até o trailer de revelação durante a E3 de 2020.

Lá se vão cinco anos e, finalmente, um Motorsport vai voltar a ver a luz do dia, com o próximo título – que, curiosamente, não deu continuidade ao numeral da série, que parou no 7 – programado para ser lançado em 2023. O que foi mostrado, no entanto, focou muito no óbvio de que, sim, o jogo está muito bonito… Mas e o resto?

O espaço de pouco mais de cinco minutos que Dan Greenawalt e Chris Esaki tiveram para mostrar o que o novo Forza Motorsport vai trazer pode ser analisado de uma forma bem simples: o bom, o mau e o feio.

O bom

Começando pelo mais fácil: visualmente o jogo está muito bonito. MUITO bonito. Isso, no entanto, já era esperado, uma vez que jogos como Forza Motorsport (e seu concorrente Gran Turismo) funcionaram durante muito tempo como benchmarks de sistema.

Esses games são pensados e desenvolvidos para mostrar do que os consoles são capazes em termos de performance (resoluções e taxas de quadros) e demonstrar novas tecnologias na prática (como é o caso do ray tracing), então, de certa forma, o mínimo é que eles sejam visualmente excelentes e tenham bom desempenho.

Ainda assim, um fator visual muito importante em Forza Motorsport e que pode passar despercebido – já que outros jogos, mesmo os simuladores mais sérios, não costumam dar importância –, é ter a parte de fora da pista mais “viva”.

A parte de dentro dos circuitos são populados por espectadores, tendas, rodas-gigantes e coisas do tipo, o que aumenta substancialmente o efeito de imersão do jogo e faz você sentir que realmente faz parte de um evento de automobilismo e não um catado de carros dando voltas num pedaço de asfalto.

As texturas do jogo, tanto nos carros quanto em elementos como asfalto, cones de sinalização, pedras e vegetação também estão excelentes, como nunca visto em outros jogos de corrida. Durante as corridas, no entanto, é algo que vai ter um impacto bem menor.

O ray tracing também é uma tecnologia que vem sendo aplicada de forma ampla e um jogo como Forza não poderia ficar de fora. Por mais que pareça exagerado em alguns momentos, com o carro parecendo um verdadeiro espelho e refletindo coisas até demais, sem dúvida alguma é uma melhoria que pode aumentar muito a imersão visual no game.

Outros três pontos abordados que não dizem respeito à parte gráfica (pelo menos não diretamente) foram a gestão de pneus (que terão mais de um tipo de composto) e combustível durante as corridas, o clima e tempo dinâmicos em todas as pistas e o curioso dado de “uma melhoria de 48 vezes na fidelidade da simulação das físicas” do jogo.

Embora na apresentação essa informação tenha ficado solta e não diga absolutamente nada, existe uma explicação que deixa tudo mais claro: os jogos anteriores da série Motorsport contavam com apenas um ponto de contato em cada pneu e o cálculo da física era atualizado 60 vezes por segundo. No novo jogo, serão OITO pontos de contato por pneu, com os cálculos sendo atualizados 360 vezes por segundo. É daí, portanto, que esse 48 saiu – mas é importante frisar que isso por si só não faz de Forza Motorsport um simulador, pelo menos por enquanto.

O clima e tempo dinâmicos trazem, por sua vez, mais imersão e ampliam as possibilidades de conteúdo dentro do jogo, visto que é algo fundamental para corridas de longa duração (o famigerado endurance), por exemplo. O impacto também vai além do visual: a mudança de clima vai afetar as temperaturas ambiente e de pista, que interferem diretamente no comportamento do carro.

Todos esses pontos citados contribuem significativamente para que, pelo menos no papel, Forza Motorsport se posicione como um simcade que almeja ser mais sério – algo que a série Motorsport, especificamente, precisava com urgência, já que Forza Horizon existe justamente para ser a contraparte mais “leve” da coisa.

Considerando a concorrência, Forza Motorsport precisa ser mais do que “um jogo com pedras e vegetação bonitas”: ele precisa ser o melhor simcade que a Turn 10 pode oferecer.

O mau

O que não jogou muito a favor do Forza Motorsport foram pontos muito importantes e que a série deixou a bola cair um bocado em seus últimos títulos: o som, a IA e o multiplayer. Esse último ponto, inclusive, tem sido o calcanhar de aquiles da Turn 10, principalmente quando Gran Turismo Sport é acrescentado na equação.

O jogo da Polyphony Digital conseguiu trazer para os consoles um pouco da experiência dos grandes títulos de simulação do PC, como é o caso do iRacing, e permitiu que os jogadores experimentassem um pouco do competitivo online. Se não bastasse, levou para o mundo real eventos muito bem estruturados e sancionados pela FIA. Forza, por sua vez, só ficou conhecido por ser uma completa várzea no quesito multijogadores.

Isso precisa mudar urgentemente se Forza quiser se sedimentar como o líder dos simcades… Mas absolutamente NADA foi falado durante o showcase e isso é um tanto preocupante.

A parte de som e de IA apareceram pouquíssimo, mas é algo que só pode ser avaliado com cuidado quando a versão final do jogo sair. Ainda assim, são pontos críticos: enquanto muitos jogadores casuais engoliram a ladainha dos drivatars, os mais experientes sabem que o sistema não faz nada além de colocar o nome de seus amigos em carros controlados pelo jogo e, por muitas vezes, o comportamento e desempenho da inteligência artificial são muito problemáticos. O som também não está na melhor forma.

Ainda que a apresentação no showcase tenha sido majoritariamente positiva, o foco excessivo em gráficos fez com que os detalhes sobre as novas funcionalidades ficassem escassos. Tudo bem que isso é fácil explicar: a informação mais fácil para o público mais casual e para os jornalistas de games é falar várias vezes sobre como o jogo é bonito e não entrar muito em tecnicalidades.

O perigo disso é criar a armadilha de que o jogo ser bonito basta, como aconteceu com Forza Horizon 5. Ignorou-se o fato de que ele era praticamente igual seus antecessores, apenas num cenário diferente, e as pessoas passaram a querer emplacar o jogo como um dos melhores lançamentos do ano quando nenhum dos títulos anteriores chegou perto disso, mesmo sendo até melhores em alguns aspectos.

Forza Horizon 5: bonito, mas a galera deu uma emocionada aí

Muito desse “frenesi” foi causado por pessoas, inclusive jornalistas, que estavam tendo seu primeiro contato com um jogo da série graças ao Game Pass. Embora a ampla disponibilidade seja algo maravilhoso, ela também fez com que muita gente que não fazia ideia do que estava falando e sem qualquer bagagem impulsionasse um movimento maluco de que, de repente, Forza Horizon 5 era o melhor jogo de corrida da história. 

A falta de abordagem de aspectos técnicos em Forza Motorsport pode causar o mesmo efeito ou até pior, com várias pessoas chamando o jogo de simulador mesmo sem nunca sequer ter passado perto de jogar um simulador de verdade – e isso é um baita de um problema, porque perpetua um ciclo de desinformação que prejudica muito o gênero de corrida.

O feio

Essa impressão não melhora muito quando Dan Greenawalt, o chefão da Turn 10, aparece nos primeiros minutos no palco para dizer que “Forza Motorsport é o jogo de corrida mais tecnicamente avançado já feito”. 

Além de ser uma citação absurda, considerando que só a parte de cálculo de físicas e modelagem de pneus de jogos como rFactor 2, iRacing, Assetto Corsa Competizione são muito mais complexas que provavelmente o Forza Motorsport inteiro, isso reforça a impressão de que o jogo está no topo da cadeia do gênero – quando, na verdade, ele está longe disso.

É claro que as promessas de novas funcionalidades alinhadas com o lado mais “simulador” do espectro é bem positivo, mas a desenvolvedora precisa começar a dosar melhor o tom do marketing.

Uma avaliação mais densa, obviamente, só poderá ser feita quando o jogo sair de fato. O que já dá pra adiantar, no entanto, é que a Turn 10 precisa ter foco para entregar o que promete – do contrário, corre o risco de entregar só mais um jogo de corrida bonito.

Igor Nápol, também conhecido Piloto de Mentirinha, é amante inveterado de automobilismo e especialista em jogos de corrida.

Tá no Twitter no @igornapol e no Twitch em CanaldoPDM