Review: Mulher-Maravilha

Quando Homem de Aço foi lançado, lá em 2013, a ideia de um universo cinematográfico da DC Comics parecia bem forte, já que a Warner Bros conta com todos os personagens da editora, ao contrário da rival Marvel, que conseguiu fazer milagre com personagens menores (que acabaram ganhando mais destaque ao longo dos anos), mas ainda tem seus maiores heróis espalhados em vários estúdios.

Só que Homem de Aço tinha um problema ao mostrar um Superman que não era bem SUPERMAN, longe daquele personagem que inspira esperança e boas ações, como acontece nos quadrinhos. Quando Batman vs Superman foi anunciado, muita gente se empolgou (eu fui um deles) pelo simples fato de ver o Superman ao lado do Batman no cinema.

Vou ser extremamente sincero ao falar que não me importei quando anunciaram que a atriz (e que na época era quase que só “modelo”) Gal Gadot seria a Mulher-Maravilha no filme. Isso porque, salvo histórias da Liga da Justiça, eu nunca tinha dado atenção pra personagem, mesmo sabendo da sua importância.

Até então, Mulher-Maravilha era uma personagem com quem eu não me importava e via apenas como uma versão do Superman dentro das histórias. Eu sabia que estava errado, mas nunca me empolguei em correr mais atrás até bem antes da estreia de Batman vs Superman: A Origem de um filme horroroso demais e que eu odeio com todas as minhas forças.

Ver a Mulher-Maravilha como uma das poucas coisas boas daquele desastre me deixou feliz, vide que logo teríamos um filme solo dela, depois de décadas sendo deixada de lado, talvez por causa do sentimento de tonto como eu que não dava a mínima pra personagem.

Só que eu tinha medo. MUITO MEDO, vide que os filmes da DCEU têm a tendência de não conseguirem adaptar direito os personagens dos quadrinhos, então, já tava imaginando que Mulher-Maravilha seria um filme cheio de momentos escuros e que não condiziam com o espírito da personagem (tipo Superman cagando pra inocentes que acabaram de virar cinzas pra dar um amasso com a Lois Lane) que, mesmo pouco, já conhecia.

E eu estou tão feliz com o resultado.

A volta da inocência

Depois de toda essa preparação, eu posso falar aquilo que você já deve estar imaginando. Mulher-Maravilha é um baita filme de origem de super-herói e que, finalmente, faz a WB/DC mostrar pra todo mundo, e não só fanboy que não quer dar o braço a torcer, que pode SIM entregar boas aventuras baseadas em histórias de quadrinhos, sem cagar completamente nos personagens (Eu ainda tô bolado com aquele Superman).

Mulher-Maravilha segue bem aquele esquema de filmes de origem, com um começo um tanto mais lento, mostrando Diana, ainda criança, em Themyscira, tentando começar o seu treinamento como amazona.

As amazonas

Esse começo é importante porque mostra o primeiro vislumbre decente de magia no DCEU (Esquadrão Suicida faz isso de um jeito nas coxas), com deuses, amazonas e a criação de uma personagem intrinsecamente boa. Apesar de ter bons exemplos, ela é boa e luta pelo bem porque isso faz parte dela, pois ela sabe que aquilo é o certo, e não porque o pai mandou ou desmandou (Superman, eu continuo olhando torto pra você).

Pelo seu isolamento em Themyscira, Diana é inocente, sem compreender o lado ruim da humanidade, apenas acreditando no certo e no errado, preto e branco. Isso é bem importante e, apesar de longe de ser uma grande atriz, Gal Gadot consegue bem vender essa ideia de alguém inocente e finalmente vendo o mundo como ele é.

Mundo esse que chega com tudo na ilha com o espião Steve Trevor, interpretado pelo Chris Pine. Eu tinha certo receio de colocarem o personagem meio como herói que resolve, enquanto a Mulher-Maravilha ainda tropeça e precisa da ajuda dele. Felizmente, apesar de ser um ótimo personagem e que funciona bem na história, o foco ainda é na Diana e como ela se transformará na Mulher-Maravilha que todos conhecem e que tem aquela música-tema sensacional.

E essa inocência da Diana é algo que funciona muito bem até para estabelecer os valores da Mulher-Maravilha como heroína.

A perda da inocência

O filme embala de vez quando Diana e Steve vão embora de Themyscira e chegam em Londres. Já na viagem, vemos algo que até então não parecia ter muito espaço nos filmes da DC: humor e leveza. Apesar de estarem indo para a guerra, o relacionamento dos personagens, como as suas visões do mundo não combinam, tudo isso deixa o filme agradável de assistir, as piadinhas funcionam (muito melhor que em um dos trailers que contam com algumas delas) e você não sente o tempo do filme passar.

E esse encontro da Diana com o “mundo real” acaba por dar um baque em muitas das crenças que ela tinha sobre a humanidade e como funcionamos. Isso ajuda MUITO no final do filme e como ele se constrói, além de trazer algo que era quase inexistentes nesses filmes (e pra não rolar chilique, até mesmo os filmes da Marvel não conseguem mostrar isso tão bem quanto parecem): esperança.

No fim das contas, seja qual for a história em quadrinhos com super-heróis, a ideia primordial deles é a que são pessoas ou seres colocados em situações extraordinárias, que acabam por inspirar àqueles salvos ou “menores” a se tornarem pessoas melhores. Talvez o verdadeiro papel do herói perante o povo é esse: inspirar a grandeza da humanidade, acreditando nesse potencial para o bem até mesmo da mais fraca das pessoas.

E Mulher-Maravilha mostra isso da melhor maneira possível, colocando uma personagem que conhece apenas o bem e o mal de uma maneira bem definida, e deve ficar frente aos horrores de uma guerra. A maneira como ela reage a isso é realmente humana, tornando uma identificação com uma pessoa com poderes absurdos, além de servir exatamente para aquilo que heróis servem: inspirar a todos.

Tropeçando, mas ainda andando firme

Mulher-Maravilha acerta bastante na construção da personagem e no que ela representa, mas o filme ainda traz alguns probleminhas. A história ainda é bem manjada e todas as grandes reviravoltas são vistas a distância, só prestando atenção no filme.

Isso não chega a torná-lo em algo ruim, mas você percebe que as coisas poderiam ter sido melhor preparadas, mas tudo ainda funciona no final.

As cenas de ação são MUITO boas e dá pra ver o dedinho do Zack Snyder nelas por causa daquele uso, às vezes exagerado, de slow motion, mas Mulher-Maravilha tem as melhores cenas de ação do DCEU até agora (aquela do Batman “salvando Martha” no armazém ainda é impressionante). Esse dedinho do Snyder aparece muito na luta final, toda de noite e com umas explosões cretinas por todos os lados.

Só que aí temos uma da Mulher-Maravilha liderando um monte de soldados, que acontece no meio do filme, que é, com o perdão da palavra, maravilhosa.

A direção da diretora Patty Jenkins é muito boa, mostrando que se a Warner realmente começar a deixar os diretores trabalharem do jeito deles, sem ter que seguir o caminho do Zack Snyder o resto da vida, a chance desses filmes funcionarem BEM com o público é enorme. O Snyder, por bem ou por mal, já criou o DCEU. Ele deu o pontapé.

O serviço da Patty Jenkins em Mulher-Maravilha, ainda que bem ligado ao Snyder, já mostra que novas vozes no DCEU só trarão vantagens para todos.

O que Mulher-Maravilha significa de verdade?

Todo mundo que for escrever sobre Mulher-Maravilha falará sobre a importância do filme para representatividade, como isso fará bem para meninas que finalmente terão uma heroína como personagem principal em um filme e tudo mais.

Tudo muito válido, mas não é meu papel para falar disso, até mesmo pelos motivos que eu dei lá em cima. Até pouco tempo atrás, eu mesmo não me importava com Mulher-Maravilha, mas reconheço que demorou tempo DEMAIS para ela começar a ter o destaque que merece.

Imagino que um filme desse é tão importante para meninas como o Batman, do Tim Burton, foi pra mim (espero que ninguém pule da mesa da cozinha e caia de peito no chão como eu fiz). Como espectador “comum”, eu adorei o filme da Mulher-Maravilha. Ele funcionou muito bem pra mim, a ponto de eu querer ler muito mais da personagem, dar a importância que não dei no passado.

Isso deve ser mil vezes maior na parte do público que nunca teve alguém para se identificar, como eu tive com aquele filme do Batman ou qualquer coisa do Homem-Aranha. Nisso, Mulher-Maravilha deve ser extremamente bem sucedido.

A vantagem disso é que ela já vai “começar” com um puta filme.